Corpos de militantes torturados eram expostos ao público interno do DOI-Codi, o maior órgão de repressão aos grupos de esquerda contrários à ditadura militar (1964-85), como “troféu de vitória”, afirmou o ex-sargento Marival Chaves nesta sexta-feira (10) em depoimento à Comissão Nacional da Verdade, em Brasília.
“Vi em duas ocasiões. O casal Antonio Carlos Bicalho Lana e Sônia foi trazido ao DOI para visitação do órgão. Vi o casal morto, com perfurações a bala na cabeça, nos ouvidos”, disse Chaves, acrescentando que supunha que isso ocorria por se tratarem de pessoas consideradas “importantes no contexto das organizações”.
Ele também citou o caso de outro militante, chamado Yoshitane Fujimori, que chegou com ferimentos a bala e ainda estava vivo.
Chaves já falou duas vezes à comissão, que apura crimes cometidos no período da ditadura militar.
O depoimento foi colhido por Cláudio Fonteles, ex-procurador-geral da República, e José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça, que integram a comissão.
Também foi convocado para depor Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel reformado e ex-comandante do DOI-Codi-SP no período entre 1970 e 1974.
Apesar de ter conseguido na Justiça um habeas corpus que lhe dava o direito de ficar calado na audiência, Ustra deu um depoimento em clima tenso, em que afirmou que a presidente Dilma Rousseff pertenceu a quatro “organizações terroristas”. Disse ainda que, se não fossem os militares, o Brasil estaria sob uma “ditadura do proletariado”.
“Nós estávamos contra o comunismo para não se transformar o Brasil num enorme Cubão. Se não fosse isso, hoje não existiria democracia no país e estaríamos vivendo um regime comunista de Fidel Castro [ex-presidente de Cuba], uma ditadura do proletariado”, disse. “Estamos aqui porque nós preservamos a democracia, senão, eu já não estaria mais aqui, teria sido morto no paredão.”
Ustra nega ter participado de sessões de tortura. No entanto, a segunda pessoa a ser ouvida hoje pela comissão, o vereador Gilberto Natalini (PV-SP), contou ter apanhado de Ustra “pessoalmente”.
“Um dia ele me pegou, me despiu, colocou em pé numa poça d’água, ligou o fio no corpo, chamou uma turma de torturadores para eu fazer uma sessão de declamação de poesia”, afirmou.
Segundo ele, a sessão de tortura durou “horas” e Ustra usou “uma vara, espécie de um cipó” para bater nele, enquanto outros aplicavam mais golpes.