Uma professora de história do Colégio Militar de Porto Alegre conseguiu na Justiça Federal o direito de retomar suas funções na escola após ser afastada por discordar do uso em sala de aula de um livro didático pró-ditadura.
Silvana Schuler Pineda, 50, se recusou a adotar em classe obras da “Coleção Marechal Trompowsky”, em que são omitidas, diz ela, violações aos direitos humanos, assassinatos e tortura promovidas pelas Forças Armadas durante o regime militar (1964-1985).
A professora, que integra o quadro de servidores civis da instituição, foi retirada em abril das aulas do nono ano e realocada em um curso preparatório, de frequência opcional, e também em tarefas de planejamento.
Antes disso, ela diz ter feito críticas ao livro em uma reunião de professores, na qual mencionou que a Associação Nacional de História contesta o uso da obra nas escolas. Na ocasião, também pediu que a direção confeccionasse um documento reafirmando por escrito a obrigatoriedade do uso do livro didático em sala de aula.
“Passei a sofrer pressão: ou eu voltava atrás ou seria punida”, diz a professora.
Os livros da série são editados pela Biblioteca do Exército. Segundo Silvana, o golpe de 1964 é explicado como necessário para resguardar a democracia no país diante do avanço do comunismo no governo de João Goulart.
“É um colégio militar, mas não posso deixar do lado de fora meus direitos e cidadania quando entro para trabalhar”, diz ela.
A professora também vê no afastamento uma retaliação por sua atuação em uma associação de servidores civis e afirma ainda que não é a única na escola a criticar a obra.
A decisão que determinou a volta ao trabalho original foi tomada no início do mês, mas ela só reassumirá as aulas após o fim do recesso escolar de julho.
O juiz federal Gabriel von Gehlen escreveu em despacho que o afastamento foi uma “sanção velada”.
A reportagem não localizou representantes do colégio para comentar o assunto. O Comando Militar do Sul informou que não teria como se manifestar nesta segunda-feira (22).
À Justiça Federal o comando do Exército, por meio da Advocacia-Geral da União, afirmou que o ensino militar tem legislação própria e que possui a finalidade de “promover a educação afinada com tradições” da corporação e de despertar vocações para a carreira na área.
Argumentou ainda que apenas fez uma “redistribuição da carga horária” da professora, a quem chamou de “intransigente”.