Por Chico Otavio e Juliana Castro.
RIO – A mais completa investigação sobre o atentado que mudou a História recente do país pode levar cinco militares, três deles generais, e um delegado ao banco dos réus. Após quase dois anos de trabalho, os procuradores da República do grupo Justiça de Transição, que apura os crimes políticos do regime militar, denunciaram seis envolvidos na explosão de uma bomba no estacionamento do Riocentro, na noite de 30 de abril de 1981, quando um show em homenagem ao Dia do Trabalho reuniu no local cerca de 20 mil pessoas, a maioria jovens.
O atentado não apenas provocou a morte instantânea do sargento Guilherme Pereira do Rosário, do Destacamento de Operações de Informações do 1º Exército (DOI-1), que carregava a bomba, como abortou a tentativa que os bolsões radicais faziam para deter o processo de abertura política durante o governo do presidente João Figueiredo (1979-1985).
Para denunciar o então capitão Wilson Luiz Chaves Machado, parceiro do sargento na ação e dono do carro onde a bomba explodiu, e outros cinco acusados de envolvimento no atentado, os procuradores produziram 38 volumes de documentos e 36 horas de gravações de depoimentos em áudio e vídeo.

A denúncia é assinada pelos procuradores Antonio Cabral, Andrey Mendonça e Marlon Weichert. Para eles, o atentado é um crime que pesa contra a pátria, portanto, imprescritível.
— O atentado do Riocentro é emblemático porque revela a torpeza e os objetivos desse grupo de radicais, integrado por membros das Forças Armadas, que estava disposto a detonar artefatos explosivos contra a própria população, num show com 20 mil jovens, apenas para gerar clima de pânico e justificar o endurecimento da ditadura militar — afirmou Cabral.
Será a quarta tentativa de submeter Wilson Machado, hoje coronel reformado, a julgamento em Tribunal do Júri. As anteriores foram frustradas por decisões do Superior Tribunal Militar (STM), que desqualificaram as provas ou entenderam que o caso estava coberto pela Lei da Anistia. O argumento usado na nova denúncia, para assegurar a abertura de processo junto à Justiça Federal, é que as investigações produziram novas provas e que os crimes não estão cobertos pela Lei da Anistia, válida apenas para o período compreendido entre 1961 e 1979.
Os seis são acusados de tentativa de homicídio doloso, explosão, transporte de explosivos, formação de quadrilha, favorecimento pessoal e fraude processual. A denúncia descreve a atuação do grupo em dois núcleos. Um deles era o de planejamento, do qual fariam parte Nilton Cerqueira e Sá Rocha. O outro era o operacional, onde Machado e Guerra se encaixaram. Para os procuradores, o elo entre os dois núcleos era o tenente-coronel Freddie Perdigão Pereira (já falecido), de codinome Doutor Flávio, um dos mais ferozes agentes da repressão política.
O militar tinha trânsito junto aos altos escalões das Forças Armadas e aos agentes operacionais porque colecionava passagens pelos principais órgãos da comunidade de informações: DOI, Centro de Informações do Exército (CIE) e SNI, onde ele estava lotado na época do atentado. Perdigão também agiu em torturas na Casa da Morte do CIE, em Petrópolis.